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O voto plural e o impacto para as startups

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O voto plural e o impacto para as startups

06/10/2021 / Publicações / POSTADO POR Jota

Com a promulgação da Lei nº 14.195/21, originada da Medida Provisória nº 1.040/21, a chamada “MP da Modernização do Ambiente de Negócios”, uma das alterações implementadas no ordenamento jurídico brasileiro, notadamente na Lei nº 6.404/76 (“LSA”), foi a viabilização do voto plural nas sociedades anônimas, o que antes não era permitido.

O tema é polêmico e gera, há bastante tempo, grande controvérsia entre os profissionais do direito, especialmente os que atuam na área societária. O fato é que o voto plural foi implementado e, no caso de empresas startups possui, em tese, o objetivo de conceder aos acionistas fundadores (“founders”) a manutenção do poder político na empresa mesmo após a realização de rodadas de investimento e, consequentemente, o ingresso de novos acionistas.

Mas afinal, qual o conceito de voto plural? O voto plural, também conhecido como “super ON”, consiste na possibilidade de uma única ação ordinária possuir o direito a vários votos em sede das assembleias gerais das sociedades anônimas. Essa lógica altera a regra até então vigente da LSA, qual seja, de que cada ação concede apenas um voto ao acionista titular, com a recente alteração as companhias poderão emitir ações ordinárias de classes distintas, atribuindo-se o voto plural a uma delas, sendo que número de votos por cada ação não poderá ser superior a 10 (dez).

O voto plural já é adotado em alguns países como Estados Unidos, Holanda, Suécia e Argentina e algumas empresas brasileiras optaram por abrir seu capital no exterior e utilizar do mecanismo em questão. A viabilização do voto plural no ordenamento jurídico brasileiro poderá impactar de maneira positiva a abertura de capital de empresas no país, uma vez que agora as empresas poderão adotar o mecanismo de voto plural sem precisar recorrer ao mercado estrangeiro.

Regras para a instituição do voto plural pelas sociedades anônimas:

A implantação do voto plural pelas companhias precede a observância de algumas regras, as quais estão previstas no Art. 110-A da LSA, sendo elas:

  • apenas companhias fechadas ou companhias abertas que instituíram o voto plural anteriormente à abertura de capital poderão adotar o instituto, ou seja, companhias que já negociam as suas ações ou valores mobiliários em mercados organizados de valores mobiliários, não poderão se utilizar do voto plural;
  • o quórum de deliberação para a implementação do voto plural, salvo se quórum mais elevado não for estipulado no estatuto social, será de metade, no mínimo, das ações com direito a voto, e metade, no mínimo, das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito, se emitidas, reunidas em assembleia especialmente convocada; e
  • foi concedido aos acionistas que não aprovarem tal instituição o direito de retirada, por meio do reembolso do valor das suas ações, salvo se a criação da classe de ações ordinárias com atribuição de voto plural já estiver prevista ou autorizada pelo estatuto social. Aqui, vale salientar a importância do cuidado ao redigir o estatuto social, de modo que as regras previstas na LSA sejam bem aplicadas e o voto plural seja bem estruturado dentro da companhia.

Restrições e salvaguardas à utilização do voto plural:

Considerando o fato de o voto plural proporcionar uma relevante e profunda alteração na governança corporativa das empresas, especialmente no que diz respeito aos poderes políticos dos acionistas e o poder de controle em si, o que seria um “desvio ao princípio de uma ação um voto”, defendido pelo Código de Melhores Práticas de Governança Corporativa do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa[1], foram previstas salvaguardas à utilização do voto plural, com o objetivo de mitigar os efeitos negativos proporcionados pelo voto plural no que se refere à governança corporativa das companhias, sobretudo quando se trata de poder de controle, já que na hipótese da existência de ações preferenciais sem direito a voto e ações ordinárias com voto plural (o que não foi vedado pela lei), haverá a possibilidade de o controle da companhia ser detido por acionistas que possuam pequenas porcentagens do capital social da empresa.

Assim, os mitigadores previstos pela LSA podem ser resumidos da seguinte forma:

  • o prazo de vigência inicial do voto plural será de até 07 (sete) anos, podendo ser prorrogado por qualquer prazo, desde que: (i) sejam observados os quóruns de aprovação acima indicados; e (ii) sejam excluídos das votações os titulares de ações da classe cujo voto plural se pretende prorrogar;
  • as ações ordinárias de classe com voto plural serão automaticamente convertidas em ações ordinárias sem voto plural (a chamada sunset clause), se (a) os titulares originais das ações as transferirem a terceiros, exceto nos casos em que: (i) o alienante permanecer indiretamente como único titular de tais ações e no controle dos direitos políticos por elas conferidos; (ii) o terceiro for titular da mesma classe de ações com voto plural a ele alienadas; (iii) a transferência ocorrer no regime de titularidade fiduciária para fins de constituição do depósito centralizado; e, ainda, se (b) o contrato ou acordo de acionistas, entre titulares de ações com voto plural e acionistas que não sejam titulares de ações com voto plural, dispor sobre exercício conjunto do direito de voto;
  • foram vedadas as operações de incorporação, incorporação de ações e fusão entre companhias abertas na hipótese de umas das companhias não possuírem a previsão do voto plural. Além disso, é a LSA também vedou a operação de cisão de companhia aberta que também não adote o voto plural para constituição de nova companhia com a adoção do voto plural;
  • o voto plural não será aplicável em votações de assembleia de acionistas que deliberarem sobre remuneração de administradores e celebração de transações com partes relacionadas; e
  • as empresas públicas, as sociedades de economia mista, as suas subsidiárias e as sociedades controladas direta ou indiretamente pelo poder público, não poderão se valer do voto plural.

Considerações Finais sobre o Voto Plural

Apesar da tentativa do legislador em proporcionar uma gama de regras com o intuito de balizar a utilização do voto plural pelas sociedades anônimas, as referidas regras ainda precisarão ser testadas na prática, de modo a ser constatada a eficácia ou não de tais regramentos.

Por conta da sua complexidade, caso as companhias desejem adotar o voto plural, é recomendável que o estatuto social seja bem estruturado para a adoção de tal instituto, fazendo com que o voto plural logre êxito em proporcionar os seus avanços prometidos.

A discussão teórica é grande e complexa, mas o fato é que o voto plural chegou para viabilizar uma maior segurança aos founders de startups no momento em que as suas companhias necessitarem de recursos financeiros e forem alvo de rodadas de investimentos. Se sabe que na maioria das startups a atuação do founder é de extrema relevância para o sucesso da companhia e, por conta disso, a manutenção dos poderes políticos pelo founder possui direto impacto nesse sentido.

Por fim, a autorização para utilização do mecanismo de voto plural em empresas brasileiras permitirá que empresas brasileiras realizem a captação de recursos financeiros no Brasil, sem ter sua governança corporativa afetada, o que poderá gerar um crescimento exponencial no número de empresas abrindo seu capital no Brasil nos próximos anos. 


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