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O Metaverso e a tributação da prestação de serviços

Por Maristela Ferreira de Souza Miglioli e Janaina Cristina Oliveira Lopes Samogim

Recentemente, Mark Zuckerberg[1] anunciou o novo título de sua famosa empresa de tecnologia, voltada para as redes sociais, a nomeando como Metaverso[2]. Segundo o conhecido empresário, o Metaverso está em construção e, em linhas gerais, figurará como um universo paralelo ao que vivemos hoje, o qual, mesmo em ambiente virtual, proporcionará aos usuários as sensações cotidianas por meio de equipamentos que reproduzirão os cinco sentidos humano: olfato, paladar, tato, visão e audição. Assim, poderíamos praticar atos reais, como a prestação de serviços nesse ambiente virtual, e ter seus efeitos no mundo real[3].

O fato é que nada do que foi anunciado figura como algo absolutamente desconhecido e inimaginável, haja vista que, desde 1999, vivenciamos alguns ensaios desse universo virtual paralelo, cujos exemplos podem ser apontados como "Second Life, Fortnite, Roblox, Omniverse, entre muitos, além daqueles que estão sendo desenvolvidos nesse momento."[4]   

Esse é o contexto que deve ser analisado quando pensamos na tributação dos serviços prestados nesses ambientes virtuais, considerando a atual inexistência de normas regulatórias de tais relações, sejam elas tributárias ou não.

O estudo da natureza jurídica dos atos praticados em ambientes virtuais, e se eles devem ou não figurar como hipótese de incidência dos diversos tributos existentes no mundo real (e, particularmente, do ISS), é desafiador, seja pela proximidade dessa nova realidade, seja pela importância crescente da estrutura tecnológica para a convivência humana, desnudada a partir da pandemia do coronavírus (Covid-19). 

Como no Brasil as regras mestras tributárias decorrem da Constituição Federal e, a partir delas, já existe uma ampla e capilar estrutura de tributação dos serviços (multiplicada pela quantidade de Municípios, titulares dessa receita fiscal), há de se questionar se esse cenário jurídico-normativo é, ou será, suficiente para atingir os serviços prestados no ambiente virtual. Trata-se, ao fundo e ao cabo, do rompimento definitivo do paradigma da “prática real do ato” como gatilho para a incidência tributária. 

Afinal, se estamos lidando com um “mundo virtual” onde nossos “avatares” serão titulares de direitos e obrigações, podendo, inclusive, trabalhar, obter renda (criptomoedas?) e adquirir bens/serviços[5], qual o impedimento para que os atos ali praticados não ensejem a incidência de tributos? 

A pergunta, na verdade, é mais ampla e abrangente: em que medida os atos praticados naquele ambiente sujeitam-se ao ordenamento juridico criado fora dele? E mais: em que medida a “força coercitiva estatal” se estende para aquele ambiente, legitimando o pilar fundamental da tributação, qual seja, o da supremacia do interesse público sobre o particular? 

E, se entendermos que o sistema tributário atual seria “compatível” com as práticas do ambiente virtual, como se resolveriam as questões de competência territorial naturalmente decorrentes do ISS? Afinal, até mesmo no nosso “velho mundo real” ainda existem, até hoje, inúmeras questões não resolvidas em torno de definir onde ocorre o fato gerador do ISS e, como decorrência, qual o Município competente para arrecadá-lo. Como transportar esse cenário para o mundo virtual, onde não há barreiras territoriais?

A prática mostra – e a jurisprudência confirma – que a aplicação analógica de soluções já conhecidas nem sempre promove a tão almejada Justiça Fiscal, permitindo-nos vislumbrar um cenário ainda mais tormentoso numa eventual “extensão” dos atuais tributos – ISS em particular – para incidirem sobre atos/atividades praticadas no metaverso.  

Nesse cenário de incertezas jurídicas, as empresas, principalmente as prestadoras de serviços (foco do presente artigo), devem antever eventual hipótese de tributação de seus serviços quando ocorridos em ambientes virtuais e firmar seus contratos da forma mais objetiva possível, numa tentativa de evitar interpretações dúbias e que possam atrair autuações ou qualquer alegação de sonegação fiscal.

[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Mark_Zuckerberg

[2] O "metaverso" é um conjunto de espaços virtuais onde você pode criar e explorar com outras pessoas que não estão no mesmo espaço físico que você. Você poderá sair com amigos, trabalhar, brincar, aprender, fazer compras, criar e muito mais. Não se trata necessariamente de passar mais tempo online — trata-se de tornar o tempo que você gasta online mais significativo. O metaverso não é um único produto que uma empresa pode construir sozinha. Assim como a internet, o metaverso existe se o Facebook está lá ou não. E não será construído da noite para o dia. Muitos desses produtos só serão totalmente realizados nos próximos 5-15 anos. Embora isso seja frustrante para aqueles de nós ansiosos para mergulhar direto, isso nos dá tempo para fazer as perguntas difíceis sobre como eles devem ser construídos. (Fonte: https://about.fb.com/news/2021/09/building-the-metaverse-responsibly/)". In "Explicando o Metaverso: Simples e Direto (Notas de Aula)”, by Eric Zompero, disponível em  https://amz.onl/5wMItpP 

[3] "Um novo modelo de negócio é avistado, arquitetos, designers e artistas plásticos estão aí para construí-lo. Esse novo universo necessita de desenvolvimento, de projetos exclusivos para novos clientes, e esses profissionais desenvolverão esses ativos digitais baseados em blockchains e NFTs.". Mesma obra de Eric Zompero, disponível em https://amz.onl/iSpDnOx

[4] Mesma obra de Eric Zompero, disponível em https://amz.onl/bBQy59t

[5] Sabe-se que já existem serviços jurídicos e de intermediação imobiliária sendo prestados no ambiente do metaverso, integrantes de um vastíssimo universo de serviços que podem ali se desenvolver. 

*O texto reflete a opinião das autoras e não representa o LexUniversal.

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