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 Direto do CARF: Contratação de artistas como PJs – o que realmente decidiu o Carf?

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Direto do CARF: Contratação de artistas como PJs – o que realmente decidiu o Carf?

10/11/2021 / Publicações / POSTADO POR Tributário

Acontece nesta semana o tradicional Congresso Internacional de Direito Tributário, promovido pela Associação Brasileira de Direito Tributário (Abradt), que, em sua 24ª edição, tem como homenageado o professor José Souto Maior Borges. Dentre os diversificados e intrigantes temas abordados, estão aqueles que vêm ganhando relevo no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Na noite de ontem, um dos tópicos eleitos para discussão, versando sobre a “segregação de atividades empresariais, pejotização e tributação de estruturações societárias”, tangencia julgado amplamente noticiado da 2ª Turma da Câmara Superior, ocorrido na sessão de 25 de outubro deste ano.

Diversamente do que divulgado em diversos portais, o ponto nodal da controvérsia não estava na aferição dos requisitos ensejadores do reconhecimento da qualidade de segurado obrigatório do Regime Geral da Previdência Social  — mediante o preenchimento de quatro elementos inarredáveis e cumulativos para tanto: a pessoalidade, a habitualidade, a subordinação e o pagamento de remuneração, nos termos da alínea “a” do inciso I do artigo 12 da Lei nº 8.212/91. O que estava em jogo naquela assentada era definir como se daria a contagem do prazo decadencial quinquenal para as hipóteses em que caracterizado que os sócios das pessoas jurídicas contratadas não passariam, em verdade, de segurados empregados. É dizer: superada a desconsideração de contratos firmados entre a emissora de televisão e as pessoas jurídicas para prestação de serviços de natureza artística, qual o regramento aplicado para fins de contagem da decadência: artigo 150, § 4º, ou artigo 173, I, do Código Tributário Nacional — CTN? Foi este o único ponto sobre o qual se debruçaram as conselheiras e os conselheiros da Câmara Superior.

Com amparo na remansosa jurisprudência dos tribunais, o Carf editou a Súmula nº 99 que, de forma bastante didática, esclarece que “[p]ara fins de aplicação da regra decadencial prevista no artigo 150, § 4°, do CTN, para as contribuições previdenciárias, caracteriza pagamento antecipado o recolhimento, ainda que parcial, do valor considerado como devido pelo contribuinte na competência do fato gerador a que se referir a autuação, mesmo que não tenha sido incluída, na base de cálculo deste recolhimento, parcela relativa a rubrica especificamente exigida no auto de infração”. Por outro lado, explicita a Súmula Carf nº 72 que, “[c]aracterizada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação, a contagem do prazo decadencial rege-se pelo artigo 173, inciso I, do CTN”.

Ainda que comprovado o recolhimento antecipado a menor, o fato de os contratos firmados com pessoas jurídicas para prestação de serviços terem sido descaracterizados pela fiscalização seria suficiente para considerar a existência de dolo, fraude ou simulação, apto a atrair a aplicação do disposto no inciso I do artigo 173 do CTN? Duas foram as correntes que se formaram.

A primeira vertente sustenta que a contratação de artistas por meio de pessoas jurídicas seria evidente forma de disfarçar a verdadeira relação existente entre as partes: aquela em que presente a pessoalidade, a habitualidade, a subordinação e o pagamento de remuneração. Assim, haveria uma “conduta consistente em ocultar o pagamento de remuneração a pessoas físicas, conferindo a essa remuneração a roupagem enganosa de um pagamento realizado em contrapartida de um serviço prestado por pessoa jurídica”. Sustentou-se que se lança mão à “pejotização” com a finalidade precípua de retardar o conhecimento das autoridades fazendárias dos fatos geradores das contribuições destinadas à seguridade social. No caso recentemente apreciado pela Câmara Superior, que envolve a emissora de televisão, é pontuado ainda que, por terem os fatos geradores ocorridos antes da entrada em vigor do disposto no artigo 129 da Lei nº 11.196/05 (Lei do Bem), não haveria que se cogitar de sua aplicação. É dizer: a lei, vigente à época dos fatos, não abriria nenhuma margem para albergar a contratação dos artistas mediante a celebração de um contrato com uma pessoa jurídica. A corrente, que ora sagrou-se vencedora, por esses motivos, ostentou o entendimento de que a decadência deveria ser computada com base no inciso I do artigo 173 do CTN, porquanto evidenciado o intuito de ludibriar as autoridades fazendárias com a celebração de contratos que encobririam a verdadeira realidade.

A segunda corrente já foi majoritária na Câmara Superior nos idos de 2016, envolvendo, inclusive, os contratos celebrados entre a mesma emissora de televisão e as pessoas jurídicas em que artistas figuravam como sócios. Pontuado que “[a]nalisando o teor do relatório Fiscal, é possível perceber que a existência de fraude é abordada apenas em relação aos contratos de trabalho, não tendo sido feita qualquer avaliação mais específica acerca dos elementos dolosos que caracterizariam o crime de sonegação ou a fraude para fins da legislação tributária pelo uso de pessoa jurídica”. Ausente a comprovação da fraude, do dolo ou da simulação, é aplicável a regra prevista no §4º do artigo 150 do CTN. A fraude, minudentemente conceituada no artigo 72 da Lei nº 4502/64, carrega a imprescindibilidade da comprovação do elemento doloso para sua caracterização. Para os que aderiram à tese ora minoritária, a conduta fraudulenta, o intuito doloso ou a prática da simulação não teriam sido comprovados pela autoridade fiscalizadora. Em suma, “[a] mera desconsideração de contratos firmados com pessoa jurídica para prestação de serviços que caracterizam vínculo empregatício não [seria] suficiente para se presumir a ocorrência de dolo, fraude ou simulação para fins de aplicação do art. 173, I do CTN”.

Ademais, para aqueles que se filiam à segunda corrente, não haveria de se cogitar a aplicação retroativa do artigo 129 da retromencionada Lei do Bem. É que, antes da edição da referida lei, não haveria norma proibitiva do modelo de negócio adotado pela emissora de televisão, que optou por contratar pessoas jurídicas para prestação de serviços de natureza artística. Desde 2005, data da entrada em vigor da Lei do Bem, apenas evidenciada a higidez, para fins tribuitários, da celebração de avença com pessoas jurídicas para “prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços”. Revela-se, por derradeiro, importante ressaltar que a constitucionalidade do artigo 129 da Lei do Bem foi chancelada pelo Supremo Tribunal Federal, no bojo da ADC nº 66, em sessão finalizada em dezembro do ano passado, prestigiando-se a livre iniciativa e a liberdade econômica.

A produção dos elementos de prova assume papel pivotal no âmbito do processo administrativo fiscal, sendo ônus das autoridades fazendárias a evidenciação e a comprovação do dolo, da fraude ou da simulação. Cabe às conselheiras e aos conselheiros do Carf, ao seu turno, externar seu livre convencimento nos casos em apreciação, sem que se olvidem da necessidade de motivar suas decisões de forma clara e congruente com os elementos probatórios constantes dos autos. Como sabiamente já advertiam os romanos, “o que não está nos autos, não está no mundo”. 


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