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Brasil na OCDE e proteção de dados pessoais

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Brasil na OCDE e proteção de dados pessoais

29/03/2022 / Publicações / POSTADO POR Portal Valor

Após diversos esforços, no dia 25 de janeiro, o Brasil foi oficialmente convidado a ingressar na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), sendo seu processo formal de participação aprovado, de forma unânime, pelos membros do Conselho. O ingresso do Brasil na OCDE não é tema totalmente pacificado - havendo aqueles que entendam ser um esforço muito grande cujos resultados são futuros e incertos -, mas tem sido uma das prioridades do governo federal nos últimos anos, razão pela qual o convite para iniciar as discussões de adesão à instituição foi recepcionado com entusiasmo.

Porém, o procedimento não é simples formalidade, sendo resultado de um rigoroso processo de avaliação. O Conselho deve decidir se vai abrir ou não discussões para o ingresso de potenciais novos membros a partir da verificação dos seguintes elementos: 1) o grau de preparação dos países, envolvendo governança econômica e pública; a habilidade, capacidade e envolvimento dos países para participar da instituição; e o alcance e impacto desses países na economia global; 2) o compromisso dos países com os valores da OCDE e com as obrigações impostas aos membros; 3) a estrutura institucional dos países (como tipo de governo, divisão de poderes, autoridade de concorrência, dentre outros); 4) os principais indicadores econômicos (envolvendo população, área, importações e exportações etc); e 5) a relação dos países com a OCDE, envolvendo a participação em seus órgãos, a aderência a seus instrumentos legais e a participação em programas de relações globais.

A ANPD tem de fato buscado, mesmo com recursos limitados, avançar com o tema das transferências internacionais

A partir do momento em que o Brasil confirmar sua adesão aos valores, visão e prioridades refletidos na Declaração de Visão dos 60 Anos da OCDE e na Declaração do Conselho Ministerial, a instituição preparará um roteiro individual para o processo de avaliação, envolvendo a análise de legislações, políticas e práticas brasileiras, e seu grau de alinhamento com normas e melhores práticas da entidade.

Dentre os diversos instrumentos legais relevantes da OCDE a serem seguidos pelos países-membros da instituição, destacam-se algumas temáticas a que o Brasil precisa devotar particular atenção: meio ambiente, governança, finanças e ciência & tecnologia são as mais relevantes delas. Se certamente esse é um desafio a ser enfrentado, é também uma grande oportunidade para o país e, especificamente pensando em instrumento que tocam em temas de proteção de dados pessoais, pode ajudar a que a agenda brasileira avance em questões relevantes.

A recomendação do Conselho relativa às Diretrizes para a Proteção da Privacidade e dos Fluxos Transfronteiriços de Dados Pessoais, adotada em setembro de 1980 e atualizada em julho de 2013, é um exemplo. Ela visa promover e proteger os valores fundamentais da privacidade, as liberdades individuais e o livre fluxo global de informações, a fim de fomentar o desenvolvimento das relações econômicas e sociais entre os membros da OCDE. As orientações representam o primeiro conjunto de princípios sobre privacidade acordado internacionalmente e foram feitas para endereçar preocupações decorrentes do aumento da utilização de dados pessoais e dos riscos de restrições dos fluxos de informações transfronteiriços para as economias globais.

Por aqui, o tema de transferência internacional de dados caminha a passos lentos. Nos últimos anos, a Lei nº 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD) foi editada e estabeleceu alguns mecanismos para lidar com essa questão. Tais mecanismos podem envolver decisões de adequação - ou seja, permitir o compartilhamento apenas para países ou organismos internacionais que proporcionem grau de proteção de dados pessoais adequado ao previsto na LGPD, conforme avaliado pela autoridade competente, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados brasileira (ANPD); ou o oferecimento e comprovação de garantias de cumprimento dos princípios, dos direitos do titular e do regime de proteção de dados previstos na LGPD, em diversos formatos - como quando a transferência resultar em compromisso assumido em acordo de cooperação internacional, por exemplo.

A ANPD vem indicando que pretende regular o assunto. Em 2021, tornou pública sua agenda regulatória, comprometendo-se a iniciar o processo regulatório sobre transferência internacional ainda em 2022, e tornou-se membro do Global Privacy Enforcement Network, rede de reguladores de privacidade e proteção de dados. Porém, a Autoridade tem encontrado dificuldades em especial por conta de sua estrutura extremamente enxuta e da enorme gama de assuntos com as quais precisa lidar e disciplinar.

No entanto, se faltava incentivo para que o tema de transferências internacionais fosse priorizado, certamente essa possibilidade de entrada na OCDE vem para suprir essa lacuna. Mostrar-se o mais adequado possível ao maior número de instrumentos da organização pode ser determinante para ditar o ritmo do processo de análise brasileiro e inclusive para que o Brasil largue na frente de outros países postulantes. Do lado da ANPD, o que se pode dizer até agora é que a autoridade tem de fato buscado, mesmo com recursos limitados, avançar com o tema. Quem sabe essa possibilidade de ingresso na organização internacional não venha para dar maior centralidade à agenda de proteção de dados pessoais brasileira - certamente ganhariam todos, em especial os cidadãos.

*O texto reflete a opinião dos autores e não representa o LexUniversal.


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